Textos e Lições 


Um encontro curioso  

por Jefferson Oliveira Cristovão da Luz *

Numa fria e chuvosa manhã de terça-feira, estava eu, no ponto de ônibus, aguardando a chegada daquele que me levaria ao serviço. De repente, surgiu um rapaz, aparentemente de uns 35 anos, estava embriagado (parecia ser apenas por álcool), porém limpo e até bem vestido, com uma camiseta verde, uma calça de cor escura e tênis.

Essa pessoa (a quem vou chamar de AMIGO) se direcionou ao rapaz que estava ao meu lado e estendeu-lhe a mão, mas não encontrou a outra mão aguardada. Por não ter sido correspondido no cumprimento, passou a falar para o outro com revolta, indignação e irritação. Suas palavras tinham um tom de ameaça, mas ao mesmo tempo demonstravam que tudo que ele buscava era um pouco de dignidade. Talvez aquele gesto não correspondido pudesse até levá-lo a fazer uma besteira (suicídio, por exemplo). É possível que naquele momento o AMIGO buscasse um motivo para conservar sua vida, algo que o fizesse desistir de cometer qualquer tipo de violência contra si mesmo.

Fiquei atento a tudo que acontecia ao meu lado. Num primeiro momento, com certo receio do que poderia ocorrer, mas depois até que me simpatizei pelo AMIGO e abri um sorriso enquanto ouvia-o. Então ele voltou-se para mim e começamos a conversar, sua voz tornou-se serena, seu semblante ficou tranquilo e ele estendeu a mão para cumprimentar-me, por três ou quatro vezes durante nossa conversa.

Ele perguntou como me chamava. Na hora, não falei meu verdadeiro nome, disse que me chamava João. Então ele disse-me que João era um nome bíblico, mas que gostava mais de Pedro, que tinha empunhado a espada para lutar contra os soldados romanos e defender Jesus. Falou também da traição de Judas, elogiou a minha barba, que, modéstia à parte, está sempre bem aparada, entre outras coisas.

De repente avistei meu ônibus ao longe e despedi-me do AMIGO, porém tive uma grande surpresa, ele pediu-me um abraço. Sem hesitar aproximei-me dele e o abracei, foi aí que tive uma surpresa maior ainda. O AMIGO, com quem conversei e de quem eu nem sabia o nome, deu-me um beijo no rosto.

Qualquer pessoa no meu lugar ficaria enojada, revoltada com a atitude daquele "estranho", todavia para mim significou o beijo mais sincero que já recebi. Aquele beijo não tinha como princípio o cumprimento de pessoas que se conhecem (o que é natural), nem um "ritual de família", nem uma demonstração de carinho entre namorados (algo rotineiro).

Com aquela atitude, o AMIGO conseguiu atingir a mais intima angústia que trago dentro do peito, acabou com qualquer ato de descriminação. Fez-me refletir sobre quem realmente precisava ter aquele encontro, e cheguei à conclusão que era eu mesmo. Propiciou-me ver que todos nós temos algo a oferecer para alguém, seja qual for sua situação. Obrigou-me a despir-me de todas as convicções, teorias e pré-conceitos e render-me ao fato de que uma atitude sincera, desprendida e verdadeira vale mais que qualquer bem material e é mais eficaz que qualquer droga (remédio) ou terapia.

 

* Jefferson Oliveira Cristovão da Luz é funcionário público, técnico em análises clínicas, técnico em administração, escreve peças e atua amadoramente na igreja, desenvolve atividade voluntária a ONG que cuida de crianças carentes e a ONG que cuida de famílias de alta vulnerabilidade social, com palestras sobre Gripe A, Higiene, DST.

Junho 2011


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